Reconhecimento do amor

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007


Amigo, como são desnorteados os caminhos da amizade.
Apareceste para ser o ombro suave
onde se reclina a inquietação do forte
(ou que forte se pensava ingenuamente)
Trazias nos olhos pensativos
a bruma da renúncia:
não querias a vida plena,
tinhas o prévio desencanto das uniões para toda a vida
não pedias nada,
não reclamavas teu quinhão de luz.
E deslizavas em ritmo gratuito de ciranda.

Descansei em ti meu feixe de desencontros
e de encontros funestos.
Queria talvez - sem perceber, juro - sadicamente massacrar-te
sob o ferro de culpas e vacilações e angústias que doíam
desde a hora do nascimento,
senão desde o instante da concepção em certo mês perdido na História,
ou mais longe, desde aquele momento intemporal
em que os seres são apenas hipóteses não formuladas
no caos universal.

Como nos enganamos fugindo ao amor!
Como o desconhecemos, talvez com receio de enfrentar
sua espada coruscante, seu formidável
poder de penetrar o sangue e nele imprimir
uma orquídea de fogo e lágrimas.
Entretanto ele chegou de manso e me envolveu
em doçura e celestes amavios.
Não queimava, não siderava; sorria.
Mal entendi, tonto que fui, esse sorriso.
Feri-me pelas próprias mãos, não pelo amor
que trazias pra mim e que teus dedos confirmavam
ao se juntarem aos meus, na infantil procura do Outro
o Outro que eu me supunha, o Outro que te imaginava,
quando - por esperteza do amor - senti que éramos um só.

Amigo, amado, amado amigo, assim o amor
dissolve mesquinho desejo de existir em face do mundo
com olhar pervagante e larga ciência das coisas.
Já não defrontamos o mundo: nele nos diluímos,
e a pura essência em que nos transmutamos dispensa
alegorias, circunstâncias, referências temporais,
imaginações oníricas,
o vôo do Pássaro Azul, a aurora boreal,
as chaves de ouro dos sonetos e dos castelos medievos,
todas as imposturas da razão e da experiência,
para existir em si e por si,
à revelia de corpos amantes,
pois já nem somos nós, somos um número perfeito.
Levou tempo eu sei para que eu renunciasse
à vacuidade de persistir, fixo e solar,
e se confessasse jubilosamente vencido,
até respirar o júbilo maior da integração.
Agora, amado meu pra sempre,
nem olhar temos de ver nem ouvidos de captar
a melodia, a paisagem, a transparência da vida,
perdidos que estamos na concha ultramarina de amar.

Carlos Drummond de Andrade;

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quinta-feira, 27 de dezembro de 2007


E ainda sim, depois de muitas voltas em torno do mesmo ponto, ainda há certas coisas que não mudam..
Um carinho, um beijo, um abraço, certas palavras que não tinham sido ditas, algumas atitudes novas, outras já conhecidas, ainda tem certas manias que eu odeio, traços que me encantam.
Será possível simplesmente fingir que nada aconteceu e seguir por outro caminho ?
Não sei.
Não sei de uma porção de coisa de um caminho que eu comecei a desenhar agora. Eu pego o meu barco e vou navegando por esse mar, quem sabe o que pode acontecer? Ahh, eu vou..
Mas eu sei do que eu não quero; e eu não quero que seja igual ao caminho traçado anteriormente, onde ele fez tudo no meu lugar e no começo eu já tinha dado por perdido.
Aos poucos, a gente aprende a tirar de velhas histórias, novas versões.
E eu nem sei como, mas eu tô aqui de novo, só que dessa vez uma coisa mudou e hoje eu carrego em mim a única coisa da qual eu precisava..
Éis o meu único objetivo, fazer de nós dois um número perfeito: UM só.

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II

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007


E quem disse que uma nova história seria ruim ?
Cansada de correr os mesmos riscos, ela passa a olhar novos horizontes, enfrentar novos medos.. mesmo sabendo que em um futuro talvez não muito distante, ela se encontre de novo aqui sozinha; e como já foi dito, de certo modo ela aprecia a solidão!
Mas ela sempre foi assim..e se alguma coisa der errado no final, ela vai se perguntar como seria se tivesse tomado o outro caminho..mas é que o outro caminho ela já caminhou e certas coisas simplesmente não devem acontecer. Tudo aconteceu no tempo certo, do jeito certo e ela sabe disso. Ela tem necessidade de ir se tornando uma pessoa melhor, pq no fundo ela sabe que as vezes ela é pior do que muitos e isso não a convém.
Ela cansou de ter os olhos vendados, de precisar da mão dele pra guiá-la, de caminhar entre o chão e o abismo. Ela precisa pousar em um terreno firme e isso ele não consegue dar. Como uma ferida que custa a sarar, ela resolveu dar o remédio certo pra doença certa.E ele que dizia que ela era uma luz no caminho dele, uma luz que o impedia de enxergar ou de fazer alguma coisa, agora ela com toda a sua frieza apaga sua luz, porque ela sabe que luzes sempre surgem e não adianta a gente apenas seguí-las, de nada adianta ser a sombra de seus passos, sem compreendê-las.

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sonhos I

domingo, 2 de dezembro de 2007


As vezes a vontade de ir embora aumenta cada vez mais, a vontade de que mais um aniversário chegue pra isso poder se realizar, eu vendo o tempo passar e as coisas um dia poderem acontecer.
Olho pela janela. A velocidade do tempo ainda me assusta.
O dia inteiro foi de um céu pesado, triste.
Imagino quantas pessoas existem lá fora, umas estudando, trabalhando, surfando, lendo, assistindo TV, dormindo, muitas vivendo muito mais que eu, que continuo aqui sentada olhando pela janela e escrevendo sobre uma vida que eu ainda não vivi. Me pego muito pensando nisso.
Fico sonhando com uma vida diferente..longe de uma cidade que eu não gosto, me imagino sentada no Parque da Cidade lendo um livro no final de tarde, e mesmo se eu estiver sozinha eu sei que eu vou estar bem..em certos pontos, a solidão me agrada; hoje em dia me sinto sozinha com uma multidão de amigos ao meu lado. Me imagino sentada em um bar bebendo depois de um longo dia de trabalho e me perguntando o que será que aconteceu com as pessoas que eu acabei perdendo contato ou será que eu vou conseguir terminar o artigo sobre comunismo a tempo; pago a conta, pego o casaco, pois é mais um dia frio e seco na cidade, acendo um cigarro e vou andando para o meu apartamento, percebo que ninguém poderia me incomodar na paz em que me encontro, nem se um ladrão me roubasse, ele não me incomodaria, ainda sim, eu estaria em paz comigo. Eu conseguiria ser uma espécie de heroína de mim mesma. Chego em casa, alimento o gato e ganho um beijo e penso 'agora eu sou feliz!'
Eu acordo.
E continuo aqui parada olhando pela janela. Está chuviscando..muita coisa já deve ter acontecido nesse tempo que eu estava aqui pensando.
Só mais um aniversário..


Os sonhos não precisam caber na realidade.

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